“É próprio da natureza humana, lamentavelmente, sentir necessidade de culpar os outros dos nossos desastres e das nossas desventuras.”
Luigi Pirandello
Dedico este artigo aos acumuladores que como eu gostam de guardar coisas inúteis, livros, apontamentos, papeis, fotos e mantêm suas gavetas, cômodos da casa, e tudo mais abarrotado de objetos descartáveis e supérfluos. Boa leitura e reflexão!
Muitos de nós temos o hábito de não desfazer de nada ou pelo menos uma boa parte do que não vamos precisar, existe uma lenda que talvez um dia iremos precisar, porém este dia nunca chega.
Tenho muitos materiais, objetos, roupas, papéis, livros mofando naquelas malas, gavetas, cômodas… que a traça e o cupim consomem num depósito que criei em minha casa para guardar coisa velha – um dos meus “Hobbies”. Imaginem que não gosto de jogar nada fora – minha filha Fabi diz que sou “acumulador”.
Não é fácil para mim jogar fora o meu lixo. Porque como meu avô dizia: “Devemos guardar tudo por pelo menos 7(sete) anos porque um dia poderemos precisar.” O que reforça a tese de “acumulador”.
“De que tamanho é o vazio que as pessoas tentam preencher com coisas?!”
(Acumuladores)
O que me chama a atenção é que o meu avô possuía poucos objetos guardados em sua casa simples. Um rádio daqueles bem grande da marca SEMP, que levei na cabeça quando criança para entregar a ele, PRESENTE DO MEU PAI para meus avós, a nossa casa era próxima dava para ir pé.
Nunca esqueço da felicidade deles com a minha chegada com aquele rádio grande na cabeça para entrega-los em mãos. Uma alegria sem tamanho. A felicidade custa muito pouco para as pessoas humildes.
Meus avós eram lavradores de boa índole, de palavra, minha referência em tudo que faziam. Mantinham em sua casa um baú e uma cômoda de madeira, uma cama, uma rede, alguns tamboretes de madeira, duas cadeiras de macarrão, uma mesa, um armário, um fogão e lenha, um abano, um fogareiro, depois um fogão a gás, algumas panelas, um filtro de barro, alguns pratos e colheres (minha avó não usava colher comia amassando a comida na mão), o local de lavar as louças, um quadro com uma foto do casal daquelas pintadas a mão afixada com um prego na parede da sala, depois uma geladeira e uma televisão, uma bilha para beber agua fria, um pote e depois um filtro de barro, uma bomba d’água no quintal para abastecer a sua casa e a dos vizinhos, uma faca, um facão, algumas ferramentas da roça, uma espingarda sempre carregada para assustar vagabundo e vigiar o comércio do meu pai – essa era uma missão do meu avô acordar não sei quantas vezes por noite para vigiar a casa e o comercio do meu pai e nos proteger – a minha segurança quando dormia à noite, além de lobisomem e a carroça de Ana Jansen, também tinha muito medo de ladrão – mas, sabia que o meu avô não iria deixar ladrão mexer em nossa casa porque se ele encontrasse algum suspeito tomava “chumbo grosso de espingarda” – o meu avô era um cabra sério, respeitado, de poucas palavras e muita ação – vagabundo não tinha vez com ele.
Possuíam também algumas vasilhas para colocar açúcar, feijão, arroz, peixe seco. Tinham o hábito de mascar fumo de rolo – permaneceram com este hábito por muitos anos até que decidiram parar de mascar, tinham algumas plantações no quintal – uma mangueira, um pé de acerola, alguns pés de cana, coentro, cebola e outros plantados numa horta em canteiro de madeira.
Muito carinho e atenção com os netos e poucas coisas a mais, além de uma sentina feita de tambor enterrado com algumas tabuas de madeira acima para ficarmos de cócoras (que tinha um cheiro que me atraia – nunca vi “bosta tão cheirosa” como aquela da sentina da casa dos meus avós). Quando queria “fazer o número 2” livre e tranquilo, saía da casa dos meus pais para a casa dos meus avós. Lá não se usava papel higiênico – era um monte de palha de coco babaçu cortada em pequenos pedaços que ficavam penduradas nas laterais daquela latrina feita de palha com uma porta mençaba (feita de palha de babaçu trançada, tipo um abano grande, pendurada por um pedaço de corda).
Vejam o poder das palavras meu avô apesar de não ser um “acumulador” dizia que devíamos guardar objetos não usados por 7 anos. O que ficou foi a palavra. E o neto “acumulador”.
“As palavras têm poder. Elas são capazes de fazer alguém sorrir, chorar, se apaixonar, odiar, sentir saudades, imaginar e sonhar.” (Raphael M. Frankel)
Desapego material é arte de jogar fora coisas velhas. Eu preciso aprender esta arte.
“Ninguém pode culpar os outros por suas escolhas.” (A Batalha do Apocalipse: Da Queda dos Anjos ao Crepúsculo do Mundo)
José Carlos Castro Sanches