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Oferece a você a oportunidade de leitura e reflexão sobre textos repletos de exemplos, experiências e lições que irão transformar a sua vida.

SERÁ QUE DÁ PARA ENFRENTAR UM MÍSSIL COM POESIA?


“Metade de mim agora é assim, de um lado a poesia, o verbo, a saudade; do outro a luta, a força e a coragem para chegar no fim. E o fim é belo, incerto… depende de como você vê! ”  (Fernando Anitelli)

Tudo começou às 14h59 min do dia 01 de junho de 2020, após eu ter compartilhado um vídeo de Mário Sérgio Corteja com o amigo Robson Junior – locutor da Rádio Mirante. O vídeo conta uma história ocorrida há 30 anos quando dois caciques xavantes foram visitar um grande mercado municipal – ao perceberem tanta comida acumulada – os dois caciques deram dois passos para trás, dentro do mercado e ficaram boquiabertos com o que viram: brancos acumularem comidas.

Repentinamente, um dos caciques parou para observar o que nenhum de nós “homens civilizados” talvez percebêssemos – havia uma criança, pobre negra, recolhendo comida do chão para comer, ao perceber a criança comendo sobras enquanto havia uma enorme quantidade de alimentos saudáveis, o cacique perguntou: por que ele está pegando comida podre se tem tanta comida boa no mercado? Os índios que nós chamamos de “selvagens” não eram capazes de entender aquela situação. Logo, os índios disseram que queriam ir embora, não apenas do mercado, mas de São Paulo.

Eles não conseguiam admitir uma criança com fome; diante de uma pilha de comida boa, ter que comer comida estragada. Aquilo era humilhante, degradante e inconcebível na cultura indígena. Os representantes do povo indígena Xavante, autodenominado A’uwē (“gente”) ou A’uwẽ Uptabi (“pessoas verdadeiras”), que chamamos de “selvagens” ficaram estarrecidos com o que viram no mundo que se diz “civilizado”. Saíram do mercado e voltaram para a tribo.

“Viva aceso, olhando e conhecendo o mundo que o rodeia, aprendendo como um índio (…) seja um índio na sabedoria. ” (Darcy Ribeiro)

Passaram-se exatos nove minutos após eu ter enviado o vídeo para Robson Junior, quando recebi um áudio, que transcrevo em parte, a seguir:

“Sanches fiquei com um nó garganta …. Tive uma discussão, em sala de aula com um amigo muito querido, doutor em filosofia, psicologia, um indigenista poderoso da UFMA – ele disse que eu queria reverter a lógica, que dizia que os índios eram selvagens. Diante disso, perguntei: mestre me diga uma coisa: o que é ser selvagem? Então, quer dizer que o índio selvagem com a flecha atinge o macho e preserva a fêmea para manter a reprodução das espécies, preserva os rios…. Ao escutar o vídeo lembrei-me da discussão com aquele mestre admirável.

Disse-lhe Mestre o homem que é um ser racional, evoluído joga uma bomba e mata mais de 120 mil pessoas em Hiroshima, quem é selvagem? Continuou dizendo: Sanches você enviou o material adequado para completar a minha live de hoje…muito grato pelo envio desse vídeo oportuno para o momento. O que é normal cara? O índio não entende porque a criança vai pegar a comida no chão tendo aquele monte de comida disponível – o que é normal cara? Eu sei que tu escreves tão bem, eu gosto tanto de ler tuas coisas. Será que dá para enfrentar um míssil com poesia, Sanches? Sei que você é um excelente cronista, quem sabe isso vire uma crônica tua. Deixo essa pergunta para o meu querido escritor. ”

“Todo o homem saudável consegue ficar dois dias sem comer – sem a poesia, jamais. ” (Charles Baudelaire)

Fiquei envaidecido com tamanha generosidade daquele extraordinário locutor e logo respondi o seguinte: “Robson, boa tarde! Nós precisamos evoluir. É possível enfrentar o míssil com poesia. Responderei a você numa crônica, em breve. Fico feliz por ter enviado algo útil para você responder aos questionamentos que a vida impõe. Tão logo escreva a crônica enviarei para você. Forte abraço, José Carlos Sanches”

Ele então respondeu: “verdade. Quando enviares, vou gravar para você” logo retruquei: “obrigado, que bom, terei a primeira gravação de um locutor de referência. Nada ocorre por acaso. Boa tarde! ”

Finalizando Robson disse:

“Sou operário Sanches. Da mesma forma que tu és um operário das letras, eu preciso vencer a apatia para escrever, talvez um dia eu seja cobrado por isso. Gosto de dar áudio, eu ofereço a voz para as palavras por isso eu já gravei áudios e vídeos para muita gente, que eu mesmo escrevi, gravei bem poucos, mas tenho contribuído com muitos e seria um privilégio gravar alguma coisa tua. Acompanho os teus textos, já li muitas dessas coisas que tu escreveste, e, para mim seria uma honra”. Assim, encerramos o nosso diálogo às 16h02min, após 63 minutos de uma conversa enriquecedora, e, sai com um desafio para realizar.

A partir deste ponto querido Robson Junior, quero me deter a respondê-lo porque acredito ser possível enfrentar um míssil com a poesia.

“Se a poesia não surgir tão naturalmente como as folhas de uma árvore, é melhor que não surja mesmo. ” (John Keats)

Sempre digo que sou movido por desafios. Quando se apresentam novas situações pelas quais não tenho uma resposta imediata, tenho a certeza de que ela sairá naturalmente como a poesia, basta pegar a caneta e a folha de papel, ou o computador e “dedilhar” sobre o teclado, como se estivesse fazendo vibrar as cordas ou teclas de um instrumento musical, numa breve melodia de Bach, que tudo se resolverá facilmente. 

Essa seria a primeira resposta à sua pergunta: você já viu alguém construir um míssil com tanta facilidade, com tanto amor e dedicação para responder ao questionamento de um amigo?

Certamente não. Porque mísseis foram feitos para destruir, matar, causar pânico, deixar as pessoas submissas ao medo, encurraladas nas suas limitações frente ao inimigo. A poesia meu amigo: é vida, é construção, traz a felicidade, retira as algemas dos aprisionados, liberta as pessoas, ainda que possa incomodar, raramente produz inimigos.

“Todas as coisas têm o seu mistério, e a poesia é o mistério de todas as coisas. ” (Federico Garcia Lorca)

A poesia, ou texto lírico, é uma das sete tradicionais, pela qual a linguagem humana é utilizada com fins estéticos ou críticos, ou seja, ela retrata algo em que tudo pode acontecer dependendo da imaginação do autor como a do leitor.

Mísseis são projéteis guiados, comandados à distância, qualquer que seja o sistema de propulsão e/ou comando de logística necessário para a sua operação tática, no campo de batalha. Também são considerados mísseis os projéteis impulsionados por qualquer propelente mesmo que sejam à base de pólvora, como foram os primeiros, ou outro, desde que aceite o comando à distância, como existiram no Brasil canhões com essas características, com raias nos canos, os obuses e outros. Alguns destes, hoje ornamentam os acervos históricos da nossa querida Ilha do Amor.

A segunda resposta seria. Se me perguntassem com quantos mísseis se vence uma guerra, dificilmente teria uma solução precisa, mas se me perguntarem com quantos poemas se transforma o coração de um homem posso dizer que apenas um simples verso ou uma bela estrofe é capaz de mudar o mundo. Senão vejamos uma ode ao amor, a poesia e a vida em cada verso de consagrados poetas:

“Amor é fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói, e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer.”
(Luis de Camões)

“Não morre aquele

que deixou na terra

a melodia de seu cântico

na música de seus versos. ” (Cora Coralina)

“ A vida é combate,

Que os fracos abate,

Que os fortes, os bravos

Só pode exaltar. ” (Gonçalves Dias)

“O poeta é luz na escuridão; pensamento, loucura, lucidez e emoção; inspira grandeza, amor e paixão; crescimento, riqueza e vibração. O poeta suspira magia; se encanta e contagia; se espanta com o que cria e nunca perde a alegria. O poeta é luz, mar e sol; doçura e amargura; flor de girassol e candura. E dele provém a essência do amor que transforma míssil em poesia. ” (Jose Carlos Sanches)

Agora, querido amigo radialista, se me pedes para escrever sobre mísseis, o que eu digo?

Até as rimas ficam difíceis

Onde não há amor não tem rima

Fogem as palavras belas

Quando me lembro com tristeza

Dos pobres desprotegidos

Diante dos fogos temidos

Eufóricos estampidos

Gemidos, gemidos…

Assim são as rimas da morte

Dos mísseis

Que não rimam com amor

Como rima a poesia

Que é luz, esperança,

Brilho, encanto e magia.

Não quero me estender estimado Robson Junior, tudo leva a crer que é fácil perceber que com poucas palavras é possível destruir um míssil e construir uma poesia. As guerras, e os misseis são sinônimos de tristeza, destruição e morte, a poesia, ao contrário é paz, alegria, abundancia, emoção, sentimento e vida. Como disse Victor Hugo: “A poesia é tudo o que há de íntimo em tudo”.

Como terceira resposta diria. Nos mísseis não há amor, na poesia transborda amor, paz, fé e Deus, tudo junto e abençoado. É imensurável a distância que separa o míssil da poesia: são antagônicos, nunca se atraem, nem combinam, não rimam, muito menos aceitariam ser amigos ou conviveriam juntos harmonicamente porque nada têm em comum, senão o “si” na grafia das suas palavras. Este, “si” poderia ser a sétima nota musical da escala de do maior nas belas sinfonias de Bach, Mozart, Beethoven, Wagner, Schubert, Schumann, Chopin. Liszt e Verdi, que faziam da música uma eterna poesia.

“Quando as aves falam com as pedras e as rãs com as águas – é de poesia que estão falando. “ (Manoel de Barros)

Veja ilustre comentarista que ao final da batalha a poesia saiu vencedora, porque naturalmente, ela se sobressai diante do míssil, que não tem força suficiente para combater a serenidade e a sensibilidade poética, que venceu pelo convencimento, não pela força. Venceu com a pena, a tinta, o teclado, a criatividade, a inspiração, o verso, a estrofe e a rima; não com ogivas. Viva a poesia! Viva o amor! Viva a vida!

José Carlos Castro Sanches

É químico, professor, escritor, cronista e poeta maranhense.

Membro Efetivo da Academia Luminense de Letras

São Luís, 01 de junho de 2020.

Visite o site falasanches.com e página Fala, Sanches (Facebook) e conheça o nosso trabalho.

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NOTA: Esta obra é original do autor José Carlos Castro Sanches e está licenciada com a licença JCS01.06.2020. Você pode copiar, distribuir, exibir, executar, desde que seja dado crédito ao autor original. Você não pode fazer uso comercial desta obra. Você não pode criar obras derivadas. Esta medida fez-se necessária porque ocorreu plágio de algumas crônicas do autor, por outra pessoa que queria assumir a autoria da sua obra, sem a devida permissão – contrariando o direito à propriedade intelectual amparado pela lei nº 9.610/98 que confere ao autor Direitos patrimoniais e morais da sua obra.

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