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Oferece a você a oportunidade de leitura e reflexão sobre textos repletos de exemplos, experiências e lições que irão transformar a sua vida.

O PELO DO GATO

Por José Carlos Castro Sanches

“Nossa insanidade tem nome: chama-se Vontade de Viver até a Última Gota.” (Martha Medeiros)

FONTE DA IMAGEM: INTERNET
                Marijuana era uma mulher determinada a manter o filho na anca durante todo o dia para não o deixar tocar no chão. Ela vivia no município de Tambiquara na região do agraste nordestino, aventurava-se em passar o tempo que se fizesse necessário para proteger o garoto franzino.
Passaram-se nove meses do nascimento e o menino ainda não experimentou se lambuzar com a areia do chão de terra batida da casa da avó Sinduca. Desde que Marijuana se separou do ex-marido, livrou-se do capeta como dizem os opositores, fez da casa da sua mãe o esconderijo secreto de Manduca sob fervorosa vigilância.

Juçara esposa de Reynald convidou a irmã Marijuana e o sobrinho Manduca para passarem as férias na capital Burundu num sítio onde moram no povoado de São Sebastião, ela fez gastos acima de suas posses para recebê-los e surpreendentemente foi informada por Marijuana que havia desistido da viagem porque tinha medo do filho contrair covid viajando de ônibus do interior até a capital, como a criança tinha apenas nove meses de idade não poderia usar máscara, motivo justo segundo ela para abortar a viagem na última hora, deixando a anfitriã desolada.

No passado não tão distante a primeira filha de Marijuana foi internada aos três anos de idade com a gripe H1N1, depois de muito sofrimento, partiu prematuramente para o céu deixando um profundo vácuo no coração da mãe. A perda da filha produziu na mãe a sensação de insegurança e medo sempre que tratava de algo relativo a viroses, bastava um espirro e um gato para a paranoia se acentuar.

Juçara gastou o pouco que tinha amealhado durante meses no trabalho doméstico, arrumou a casa e surtiu o armário com alimentos para receber a irmã Marijuana e o sobrinho Manduca. Contam as más línguas que a ideia de que Manduca iria contrair o coronavírus foi plantada pela avó Sinduca para não ficar distante do neto.

O fato é que Marijuana tem uma fixação que a impede de deixar o filho pisar ou tocar no chão, dizem que ele passa o dia escanchado na anca da mãe que ao anoitecer mal consegue deitar-se devido a canseira diária, enfadonha na labuta incansável e injustificada. Ela sequer chega a pensar se Manduca gosta de viver naquela condição, entretanto parece querer que o seu filho seja poupado das adversidades se doando para viver até a última gota por ele. Como disse Cláudio Bitti: “Pais superprotetores, acabam prendendo seus filhos em suas próprias gaiolas.”

Manduca magrelo, amarelado está terminantemente proibido de chegar próximo aos dez gatos que vivem soltos na casa da avó. Deve haver um motivo para a preocupação excessiva da mãe com o filho. Os conhecidos alegam que a perda da filha aos três anos tornou-a insegura o que a faz superproteger o filho Manduca que sequer tem a oportunidade de se lambuzar na terra e experimentar o sabor do barro das paredes de taipa da casa da vovó Sinduca. Tudo porque a possessiva Marijuana não permite. Quem sabe ela esteja por telepatia aplicando inconscientemente a premissa de Raul Seixas, de que: “A arte de ser louco é jamais cometer a loucura de ser um sujeito normal”.

Após o nascimento do filho, Marijuana separou-se do ex-marido João Simão suposto pai de Manduca. Dizem os(as) fofoqueiros(as) do povoado que João era um cabra da peste, cachaceiro e trapaceiro, desde que a mulher engravidou passava as noites na putaria e farra com os pretensos amigos.

Quando o filho nasceu usou o pretexto de não estar empregado e ter poucos recursos para sustentar uma família, com essa desculpa deixou a coitada sozinha com o bebê para ficar totalmente livre correndo beirada nos prostíbulos, bares e barracas do lugarejo; bebendo todas sempre que alguém se dispusesse a pagar a “abençoada dose de água que passarinho não bebe”, como ele dizia.

Marijuana sentindo-se abandonada, sem os cuidados do marido e tendo a responsabilidade de cuidar do filho Manduca resolveu voltar para a casa da mãe, que deveria se ser chamada de Joana, não de Sinduca, visto que o seu nome de registro era Joana, mas o apelido de Sinduca prosperou ao ponto de predominar sobre o nome de batismo o que era muito comum naquela região.

Ao retornar para a casa materna Marijuana, sem ter o que fazer naquele sitio grande com pouca ou nenhuma condição financeira apegou-se ao filho, com intensa síndrome de proteção dia e noite – noite e dia, sem parar nem para “cagar”, porque o pentelho entrava na latrina junto à anca da mãe que o segurava com uma mão e limpava a “bunda” com a outra, verdadeiro desatino.

Certo dia Marijuana percebeu um pelo de gato na barriga de Manduca. Toda a vizinhança ficou sabendo em minutos do ocorrido devido ao descontrole emocional daquela jovem mãe que queria a todo custo entender como aquele pelo de gato foi parar na barriga do seu filho, visto que ela não o deixava tocar no chão, tampouco aproximar-se dos dez gatos da casa da vovó Sinduca.

Dizem que o moleque aos nove meses deveria estar engatinhando, todavia privado pelos caprichos da mãe excessivamente protetora deverá passar direto da fase de “escanchado na anca” para “caminhante inseguro”. Fiquei a imaginar o quanto uma mãe desestabilizada e abalada devido à frustração pela morte da filha pode destruir um filho, sem imaginar a extensão do prejuízo ela segue com as mesmas práticas, aperfeiçoando-se a cada dia na arte de transportar o magrelo, amarelado pela falta de sol e alimento; que se tornara dependente visceral devido ao desvario da pobre mãe alienada.  

Seria sensato julgar culpada uma mãe que passou pelo sofrimento da perda de uma filha, e projetar a mesma possibilidade para o filho único? Imaginar que Marijuana seja louca é ingenuidade? Culpá-la por ter medo do filho pisar no chão de terra batida seria uma tortura? Julgá-la pela ansiedade excessiva e medo do filho contrair o coronavírus seria barbárie? Sacrificá-la pelo fato de não aceitar que o filho brinque com os gatos seria uma crueldade? Prendê-la por manter o garoto na latrina enquanto faz as necessidades fisiológicas seria uma boa solução? Saber o que leva Marijuana a ter alucinações quando imagina encontrar um pelo de gato na barriga do filho, esse sim é o problema que os psicólogos e psiquiatras precisam ajudá-la a resolver  do contrário ela carregará Manduca na anca pelo resto da vida.

É provável que enquanto houver “pelo de gato e chão com terra batida” Marijuana não tenha sossego e Manduca terá a sua cangalha garantida. Será que Marijuana consegue ser feliz assim? Ela tem tempo para escutar uma música sem pensar no pelo do gato? Clarice Lispector responde: “No mais fino e doído do seu sentimento ela pensava: Vou ser Feliz!. Friedrich Nietzsche, complementa: “E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por  aqueles que não podiam escutar a música”.

Moral da história: a avó Sinduca tem transtorno bipolar e Marijuana sua filha herdou as paranoias da mãe e quem sofre as consequências é o neto Manduca.

Fim de papo sobre Marijuana, agora é hora de cuidar da sua vida. Quais são as suas paranoias, alucinações, medos, obsessões, manias, fraquezas…? O que você tem feito para libertar-se das amarras criadas pela mente fértil ? Liberte-se do cativeiro, submissão, vício e dependência. Liberte-se enquanto há tempo: a mente doentia escraviza.

São Luís, 14 de julho de 2022.    

José Carlos Castro Sanches

É químico, professor, escritor, cronista, contista, trovador e poeta maranhense. Membro Efetivo da Academia Luminense de Letras, da Academia Maranhense de Trovas, da Academia Rosariense de Letras, Artes e Ciências, da Academia de Letras, Artes e Cultura de Coroatá, da Associação Maranhense de Escritores Independentes, da União Brasileira de Escritores e do PEN Clube do Brasil.

Autor dos livros: Colheita Peregrina, Tenho Pressa, A Jangada Passou; No Fluir das Horas é tempo de ler e escrever, A Vida é um Sopro, Gotas de Esperança, Pérolas da Jujuba com o Vovô e vinte livros inéditos. Visite o site falasanches.com e a página “Fala, Sanches” (Facebook) e conheça o nosso trabalho.

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NOTA: Esta obra é original do autor José Carlos Castro Sanches e está licenciada com a licença JCS14.07.2022. Você pode copiar, distribuir, exibir, executar, desde que seja dado crédito ao autor original. Você não pode fazer uso comercial desta obra. Você não pode criar obras derivadas. Esta medida fez-se necessária porque ocorreu plágio de algumas crônicas do autor, por outra pessoa que queria assumir a autoria da sua obra, sem a devida permissão – contrariando o direito à propriedade intelectual, amparado pela Lei nº 9.610/98, que confere ao autor direitos patrimoniais e morais da sua obra.

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