“Não nos perguntamos qual o propósito dos pássaros cantarem, pois, o canto é o seu prazer, uma vez que foram criados para cantar. Similarmente, não devemos perguntar porque a mente humana se inquieta com a extensão dos segredos dos céus… A diversidade do fenômeno da Natureza é tão vasta e os tesouros escondidos nos céus tão ricos, precisamente para que a mente humana nunca tenha falta de alimento. ”
(Johannes Kepler)
Acordei na madrugada com o ruído vindo do fundo do quintal da minha casa semelhante ao de um pássaro sendo “tragado, engolido, comido” por uma serpente “cobra”, ou coisa parecida. De repente, não sei porque, me lembrei do “Canto da pipira azul ao amanhecer na árvore do meu quintal”.
“Sou amigo da madrugada. Consigo ouvir o uivar do vento, o cantar dos pássaros, a gota d’água que cai na terra após a chuva e o ronco do meu vizinho. ” (Jefferson Camargo)
Ao amanhecer entre o canto dos pássaros e o calor do sol a tocar meu rosto por entre a fresta da janela pensei em tudo de belo que a vida nos apresenta e que muitas vezes acabamos perdendo quase sempre por falta de ousadia talvez, mas hoje vou fazer diferente vou me arriscar o máximo que a vida me permite.
Escrevo este artigo em homenagem ao meu filho Carlos Daniel e Joao Bragança um amigo distante que não vejo há anos, que projetou e plantou o jardim florido da minha casa. Não esqueço das pessoas que me ajudaram em todos os momentos da minha vida. A gratidão é virtude dos sábios.
“O mundo da simplicidade, da natureza, da fonte de água limpa e do canto dos pássaros é um pedaço do céu e a voz de Deus, que muitos não conseguem ouvir.” (Luiza Gosuen)
Canto é um lugar querido onde nos escondemos, moramos, encontramos os amigos, sentamos para jogar conversa fora, fazer prosa, tomar umas e outras…também pode ser um lugar seguro e aconchegante onde os pássaros possam cantar, fazer seus ninhos…pode ser os galhos de uma árvore no fundo do quintal…
Cantar é expressar-se vocalmente por meio de frases melódicas; entoar.; a ave que emite som audível; não necessariamente musical. Emitir sons musicais com a voz; cantar uma música; Celebrar por meio de versos ou prosa: declamar; Seduzir com palavras ou maneiras hábeis; Persuadir alguém buscando convencer esta pessoa; Argumentar; Produzir certos ruídos que formam harmonia: a água canta no córrego, o canto dos pássaros; Poesia em forma de música; cântico. Texto poético que exalta ou louva alguém; Exaltação.
“Seja como os pássaros que, ao pousarem um instante sobre ramos muito leves, sentem-nos ceder, mas cantam! Eles sabem que possuem asas.” (Victor Hugo)
No ano 2001 quando nascia o meu filho Carlos Daniel e concluía a construção da minha casa. Um amigo projetou e plantou um jardim florido em minha casa. Este jardim com cerca viva, lindas flores e uma árvore que ocupava o centro do fundo do quintal da minha casa. Apreciando a beleza desse jardim escrevo este artigo. Na varanda da minha casa sobre o efeito do vento de outubro que balança as árvores e movimenta as águas nos rios e mares do maranhão. Numa dança que encanta os navegantes da minha querida ilha de São Luís. Cantada em verso, prosa e poesia pelos poetas e aspirantes.
Os arbustos do jardim e a árvore plantada no centro do quintal cresceram e com elas os pássaros tomaram conta do meu aconchego.
Todos os dias “um pássaro azul” de canto lindo e estridente naquela árvore para me acordar. Já sabia o meu horário de acordar para ir ao trabalho. Era o meu “despertador” natural. O meu relógio “divino”. A minha alegria e benção matinal.
Interessante que os pássaros já amanhecem o dia cantando. Eles eram a minha inspiração para ver o mundo com o olhar dos pássaros que cantam alegremente sem pedir nada em troca. Não sabem o que pode acontecer, nem pensam sobre as consequências do amanhã. São livres para voar e cantar assim era a “pipira azul” que me inspirava no alvorecer, cantando na árvore do quintal ao lado do meu quarto de dormir.
“Um pássaro que repousa numa árvore nunca teme que o galho quebre, porque a sua confiança não é no galho, mas nas suas próprias asas. ” (Elis Busanello)
Aquela árvore cresceu, cresceu…e começou a lançar folhas sobre o telhado da minha casa. As folhas secas dificultavam o escoamento das águas da chuva sobre o telhado e provocavam goteiras e vazamento de água. As pequenas folhas vazavam por entre as telhas, através das fendas, para dentro de casa. E minha mulher indignada reclamava o tempo todo das folhas sujando a casa, e pedindo para cortar a árvore. Aquela bela árvore era acusada diariamente de algo que não tinha culpa e deveria ser sacrificada sem sequer ter a oportunidade de um julgamento justo e direito à legitima defesa. Somos cruéis e às vezes insensatas quando tratamos com indefesos, inofensivos.
Precisava varrer a casa inúmeras vezes por dia para manter a casa limpa. Mania de mulher zelosa. Querer a todo tempo a casa limpa e organizada. Um saco! Para quem em alguns momentos quer viver a liberdade da “bagunça” com um pouco de sujeira na casa. Folhas, poeira, galhos secos… dão um ar de liberdade e abstração necessários em determinadas situações.
“Uma árvore em flor fica despida no outono. A beleza transforma-se em feiura, a juventude em velhice e o erro em virtude. Nada fica sempre igual e nada existe realmente. Portanto, as aparências e o vazio existem simultaneamente.” (Dalai Lama)
A árvore estava incomodando. E quase todos os dias recebia reclamação de que deveria corta-la. Suportei alguns anos a resmungos recorrentes e mantive intacta por determinado tempo. Esconderijo e ninho dos pássaros do meu quintal.
Certo dia cansado cedi aos apelos e mandei cortar a árvore bela que sombreava e refrescava meu pedaço de chão, mantendo fresca a parede do meu quarto e florindo a minha imaginação.
O moço da “serra malvada” cortou a minha árvore, retirando todos os galhos, folhas e flores. Deixou apenas o tronco a uma altura aproximada de 1(um) metro do chão. Uma tristeza tomou conta de mim quando cheguei em casa, cansado do trabalho, ao final da tarde e percebi aquele tronco sem galhos, folhas… aparentemente sem vida. Ou ainda que houvesse vida a minha arvore estava amputada – severamente limitada.
“A árvore quando está sendo cortada, observa com tristeza que o cabo do machado é de madeira.” (Provérbio Árabe)
E o amanhecer do dia seguinte sem o canto da pipira azul: “uma tristeza”.
Lembrei-me quando criança lá em Rosário, na casa dos meus pais criávamos vários pássaros: curió, xexéu, canário, papagaio, periquito, bigode, papa-capim, guriatã, bigode, pipiras azuis e pretas, cutia, coelho…tudo a contragosto do nosso pai que gostava de ver os animais soltos. Quando meu pai ficava furioso com o nosso desleixo na alimentação e cuidado com os animais, se irritava e libertava os “prisioneiros” das gaiolas, cárceres privados, prisão… para tomarem rumo ignorado e, livres na natureza pudessem tomar rumo ignorado e experimentar da liberdade plena que todos os pássaros, animais e homens deveriam ter assegurado por todo a vida. A prisão ainda que inocente é danosa e perniciosa. Todos almejamos e valorizamos a liberdade!
Aquele canto da “pipira azul” já estava comigo desde a infância, balançava a minha rede e alimentava a minha esperança.
“Existem 3 maneiras de se chegar ao topo de uma árvore: 1) subir nela; 2) Sentar em cima da semente; 3) Ficar amigo de um grande pássaro.” (Robert Maidment)
Voltando ao tronco da árvore no fundo do quintal. Com o passar dos dias, irrigado pelas chuvas aquele tronco, que parecia um pedaço de pau seco, sem vida, começou a brotar. Nasceu o primeiro galho, o segundo, e muitos outros seguidos…até tornar-se novamente uma árvore frondosa “amputada”, mas viçosa.
Não sei como a natureza é capaz de recuperar com tanta beleza e vitalidade o que destruímos pela nossa falta de sensibilidade com ela. Uma benção de Deus!
O mais surpreendente é que a “pipira azul” que tanto me alegrou com o seu canto e havia desparecido do meu quintal, após o corte da árvore. Voltou a cantar naquela árvore “ressuscitada”.
“O desejo é uma árvore com folhas; a esperança, uma árvore com flores; o prazer, árvore com frutos.” (Guilherme Massien)
Quanta vontade de viver existia naquele tronco de árvore dilapidado. Nada poderia contê-lo, nem mesmo a “serra maldosa” daquele ‘açougueiro” de árvores, orientado pelos insensíveis guardiãs da casa que se deixavam incomodar pelas simples folhas e pequenas goteiras no telhado.
“Se quiser derrubar uma árvore na metade do tempo, passe o dobro do tempo amolando o machado. ” (Provérbio Chinês)
Por tão pouco foram capazes de “amputar’ uma árvore, com a pretensão de matá-la. E tirar o sombrio e ventilado sossego “ninho” daqueles pássaros azuis que abrilhantavam o meu dia com os seus cantos gloriosos. Aquele som agradável que trazia felicidade ao amanhecer, relaxamento, tranquilidade à minha manha voltou.
Por poucos anos a árvore teimosa voltou a crescer, alongaram-se os galhos e folhas verdes floresciam dia após dia. E mais uma vez foi extirpada, desta vez pela raiz deixando apenas a lembrança da sombra dos galhos e folhas secas no chão e telhado, do som do vento balançando os galhos, do canto dos pássaros que me inspiraram a escrever esse artigo em homenagem ao amigo João Bragança que me presenteou com árvore e o jardim florido da minha casa e a Carlos Daniel Sanches, meu querido filho que no ano em que nasceu para alegrar as nossas vidas estava sendo plantado o mais lindo jardim para os meus olhos.
A estes quero dizer que: Assim como a árvore do meu quintal não deixem que nada possa impedi-los de avançar na vida. Tenham a certeza de que tudo que se apresentar como obstáculo poderá ser vencido, não existe barreira intransponível que não possa ser vencida por aqueles que têm fé, determinação, força, foco, perseverança e coragem para enfrentar os desafios de frente. Nunca desistam. Jamais deixem que as pedras no caminho possam interromper as suas trajetórias de sucesso e de bênçãos determinadas pelo nosso soberano DEUS.
“A vida é combate que aos fracos abate, aos fortes e bravos, como vocês, só pode exaltar.” G. Dias
O canto do pássaro azul naquela árvore resistente e determinada a VIVER independentemente das limitações impostas a ELA. Nos faz refletir que NADA É CAPAZ de deter a FORÇA DA NATUREZA e o CANTO DOS PÁSSAROS. Continue cantando LIVRE meu pássaro. A VIDA É BELA!
“Quando a árvore é pequena, o jardineiro orienta-a como quer. Mas quando a árvore cresceu, já não pode reorientar as suas curvas e sinuosidades.” (Abu Shakur)
Enquanto escrevia este artigo cantava uma “pipira preta” no arbusto mais frondoso do meu jardim. Cantava e pulava de galho em galho alegremente. A cada dia um novo pássaro a cantar para me alegrar. São multiplicadas bênçãos a merecer a minha gratidão eterna.
O desenCANTO do pássaro azul. Perdeu a sua árvore preferida, o seu ninho e aconchego. Eu perdi a sombra, o ruído do vento nos galhos, a beleza do verde, o canto dos pássaros…
“Cada fase da vida tem os seus encantos e desencantos, e todas passam. Crescer é inevitável, superar é uma boa opção.” (Rosi Coelho)
Assim como os pássaros somos vulneráveis, frágeis, mutáveis e podemos voar para novas direções. Buscar novas árvores para construir nossos ninhos e cantar alegremente.
A vida nos oferece a oportunidade de canto, encontro, desenCANTO e desencontro. Precisamos estar preparados para cada momento e dispostos à mudança e desapego das nossas árvores, aconchego e ninho.
Praticando o desapego:
“Sempre é preciso saber quando uma etapa chega ao final. Se insistirmos em permanecer nela mais do que o tempo necessário…Perdemos a alegria e o sentido das outras etapas que precisamos viver…”
Vai minha “pipira azul” em busca de novas plagas… desapegada daquela frondosa árvore, em busca de um novo ENCANTO para disseminar o teu lindo CANTO. “Mais bonito que o canto dos pássaros, são os seus voos. Nem todo canto é de alegria, mas todo voo é de liberdade.”
“Desapegar-se, é renovar votos de esperança de si mesmo. É dar-se uma nova oportunidade de construir uma nova história melhor. Liberte-se de tudo aquilo que não tem te feito bem…” (Fernando Pessoa)
José Carlos Castro Sanches