“A amizade e o amor estimam-se como dois irmãos que têm uma herança a partilhar. ” Axel Oxenstiern
Etimologicamente, a palavra herança surgiu a partir do latim haerentia, sendo utilizado para definir o legado ou patrimônio que um indivíduo pode deixar para os seus descendentes. O termo “herança”, como um bem que é transmitido de uma geração para outra, pode ser atribuído a muitas situações, sendo as principais no contexto social, cultural, biológico e jurídico.
“Acho que nada acontece por acaso, sabe? Que no fundo as coisas têm seu plano secreto, embora nós não entendamos. ” Carlos Ruiz Zafón
Nada ocorre por acaso! Após escrever a crônica O BESOURO E A FLOR! Continuei sentado no banco de palha sintética e o besouro voltou pousando nas mesmas flores de outrora. Enquanto isso, sentou-se próximo de onde eu estava, uma senhora que aguardava a sua filha que brincava no playground e arredores do jardim do condomínio com a minha neta Julie. Aproveitando a oportunidade mostrei a ela a referida crônica. E para minha surpresa ela declarou que o seu pai foi poeta, músico, trovador, compositor, repentista, radialista, jornalista e escritor maranhense, com inúmeras obras literárias, canções de sucesso e lindas poesias. Eu estava diante de Heleudes Nazaré da Silva Bogéa, irmã de Jorge da Silva Bogéa e filha do ilustre e saudoso boêmio João Batista Lopes Bogéa nascido em 24 de junho de 1926, no município de Guimarães e casado com Leutre da Silva Bogéa com quem teve um casal de filhos Jorge e Heleudes.
“Nada na vida é por acaso. Cada pessoa que você conhece, tem um propósito: Uns testarão você, outros te usarão, e alguns te ensinarão. E ainda existirão aqueles que despertarão o que há de melhor em você…” Autor desconhecido
Heleudes, ainda que rapidamente, sem que nos conhecêssemos ao ponto de confidenciar suas reminiscências, contou-me um pouco da história do seu pai, das parcerias musicais que fizera com o cantor e compositor maranhense Antônio Vieira, inclusive que o seu pai recomendara uma mudança na letra da música Tem Quem Queira.
Antônio Vieira escrevera na versão original da referida música: Se você não quer tem quem queira – a sugestão do seu pai fez com que ele mudasse para: Se Tu Não Quer, Tem Quem Queira. Eles eram parceiros e, muitos trabalhos eram compartilhados para revisão e sugestões recíprocas. Se completavam nas criações e alimentavam uma grande amizade.
Disse também como surgiu a ideia desta música, contada pelo próprio autor. Segundo ela, Antônio Vieira estava sentado num banco quando chegou uma mãe com um prato de comida na mão oferecendo para o filho que teimava em não aceitar o alimento. Ao observar a cena, o circunspecto ancião, ao perceber que havia um cachorro próximo, intrometeu-se, na conversa da mãe com o filho e disse para a criança: Se você não quer tem quem queira.
Daí a inspiração para a música de sucesso. Após o relato percebi que a nossa história tinha uma relação que não se devia ao acaso, quando citei que o escritor José Fernandes prefaciou os meus três livros da Tríade Sancheana, ela disse que José Fernandes era muito amigo do seu pai. Quando citei a parceria com José Viégas da AMEI – Associação Maranhense de Escritores Independentes e com José Neres, escritor maranhense – ela reforçou que estes escritores, dentre outros poetas, cantores e jornalistas maranhenses conheciam ou faziam parte do seleto grupo de amigos do seu falecido pai.
Tive a certeza de que nada ocorre por acaso quando ela externou o desejo de republicar algumas obras de Lopes Bogéa e, também da sua intenção de criar um site onde pudesse reproduzir parte do trabalho do seu pai, que no seu entender estava esquecido pelos maranhenses.
Para mim é motivo de jubilo resgatar a história de ilustres protagonistas da literatura, arte e cultura do nosso querido estado do maranhão, berço de personalidades e grandes vultos como Lopes Bogéa e Antônio Viera.
Sinto orgulho e felicidade por ter a oportunidade de conhecer um pouco da trajetória destes grandes homens das letras, música e jornalismo, certo de que a história não deixará no limbo do esquecimento os seus maiores talentos.
Espero que a filha de Lopes Bogéa realize o seu sonho e reviva os momentos felizes da infância quando junto ao seu pai – revisava e corrigia as suas publicações e, que consiga reunir e reproduzir a coletânea das obras do seu amado progenitor para todos os recantos do Maranhão, do Brasil e do mundo. Para que todos possam conhecer o que há de mais belo e precioso no legado intelectual e nas obras de grande valor literário e artístico do nobre imortal de Guimarães João Batista Lopes Bogéa, que se fez presente e atuante na ilha de upaon açu deixando saudade e profundas reflexões em suas mais de 300 (trezentas) composições. Em 2002, a pedido dos amigos conterrâneos Chico Saldanha e Zeca Baleiro, registrou algumas delas para o CD – Balançou no Congá, que morreu sem ver editado.
Lopes Bogéa e Antonio Vieira. Que Deus os tenha no seu mais abençoado paraíso. Continuem irradiando alegria, cantando e difundindo a nossa cultura e replicando os acordes harmoniosos de belas músicas, entre os anjos, em especial a música TEM QUEM QUEIRA com a qual encerro esta crônica em homenagem à amizade desta dupla maranhense que deixou para todos nós um legado de inestimável valia compartilhando a sua grande herança cultural.
Amigo, se andas triste
Vai para uma brincadeira
Se tu não quer; Tem quem queira (2x)
Se é por falta de dinheiro
Te dou trabalho na feira
Se tu não quer
Tem quem queira (2x)
Se o teu caso é mulher
Tem a Maria Moreira
Se tu não quer
Tem quem queira (2x)
Ela gosta é de ti
E é uma mulata faceira
Se tu não quer
Tem quem queira (2x)
Se te dou esse conselho
É pra tu sair dessa asneira
Se tu não quer
Tem quem queira (2x)
O amor é muito bonito
E ele não tem pasmaceira
Se tu não quer
Tem quem queira (2x)
Portanto não bota fora
A tua alegria brejeira
Se tu não quer
Tem quem queira (2x)
Vai gozar a tua vida
Que ela é breve e passageira
Se tu não quer
Tem quem queira (…)
“Nada acontece por acaso, tudo tem um porquê. Ou você acha que as folhas do outono caem porque querem? ” Deborah Evelyn