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Oferece a você a oportunidade de leitura e reflexão sobre textos repletos de exemplos, experiências e lições que irão transformar a sua vida.

A BARBA

Por José Carlos Castro Sanches

“Sentei-me para fazer o meu livro. Escrevi e escrevi sem parar. Um dia, olhei no espelho e a barba estava lá. Gostei, sobretudo, porque desvia a atenção. Deixaram de apontar-me como ‘aquele careca’ e passei a ser ‘aquele barbudo’. ” (Enéas Carneiro)

Passei pouco mais de dois meses experimentando um rosto diferente, deixei os cabelos crescerem na barba e bigode para sentir outra vez depois de 36 anos como ficaria e minha aparência e como me veria naquela imagem ao amanhecer, tomar banho, anoitecer e nas demais vezes que me aproximava de um espelho.

É fácil perceber que passei por uma metamorfose, alguns gostam, outros não da minha mudança de visual, mas eu gostei de ficar diferente, embora que a barba me faça parecer mais velho. Essa foi uma conclusão que tirei após o período de “envelhecimento precoce” – percebi que os cabelos da barba e do bigode ficaram mesclados de branco e preto, mais daquele que destes, o que indica que realmente estou envelhecendo. Se comparado há três décadas, quando passei por experiência similar, ficou flagrante a evolução dos cabelos brancos em detrimento dos pretos.

Por outro lado, a barba passa um certo ar de sabedoria, de conhecimento, de inteligência, de amadurecimento, que não sei bem explicar, assim como me fez aprofundar a visão da finitude, da evolução, da passagem do tempo sobre a minha vida, me fazendo perceber que não serei eterno, apesar da bela barba, que preenche parte do meu rosto. Enquanto, a calvície levou parte dos meus cabelos deixando a minha cabeça mais brilhante, criativa e visionária, a barba fez-me lembrar que os cabelos nascerão enquanto eu tenha vida, todavia não terão a mesma tonalidade dos tempos de outrora. Na juventude parece que tudo é mais fértil e virtuoso, que na idade adulta.

“Você não amadurece ao comemorar um aniversário, ao ter barba, ao entrar para a faculdade. Você amadurece ao chorar uma noite inteira, se questionar a cada lágrima e acordar sorrindo. ” (Rogger Stankewski)

Nestes dias me alegrei com a possiblidade de tirar a barba e parecer mais jovem, descobrindo a fonte da juventude, quase aos 60. Se bem que recebi alguns elogios que posso declarar, chegaram a dizer para manter a barba que ficava mais elegante, charmoso, outras disseram que eu estava mais parecido com um poeta e escritor. Aproveito a oportunidade para deixar claro que o poeta, cronista e escritor não depende de barba ou outra característica para tornar-se referência, afinal barba não amplia conhecimento e inteligência apesar da fantasia que se criou sobre a imagem dos intelectuais; o que os torna diferenciado e imortal é a sensibilidade, a emoção, o sentimento, o amor, a flor, o tempo, o silencio, a poesia, a magia, o verbo, e, o encanto pela arte, cultura, ciência  e literatura; sobretudo a sabedoria para transformar pensamento em prosa, versos, estrofes, poemas, crônicas e tudo mais que faz das coisas simples a beleza da vida.

Havia também a torcida contrária, meu neto Rafael que não quer me ver nem por meio de imagens de vídeos, mesmo pelos contatos telefônicos, sempre que eu apareço ele corre feito um pintinho para se esconder do lobo mau. A minha neta Julie, diz sempre que eu estou muito feio, aliás, mais feio, porque bonito, ela diz, que é o pai dela (aqui uma cacofonia, que tratei na crônica “No Maranhão Babaçu Abunda”). Meu outro netinho Leonardo Davi, sempre que me vê fica escabreado (essa palavra é uma gíria comum no Maranhão, talvez os leitores do Piauí não a conheçam) parece que não entende muito bem o que fizeram comigo, para manter aquele monte de cabelo na cara. Amelie, a nova neta, ainda não me disse nada porque ao nascer eu já estava na condição de barbudo.

As minhas filhas não se manifestam para não magoar o pai, entretanto pelo olhar dizem alguma coisa, que só um pai é capaz de captar. Os vizinhos e amigos devem ficar se perguntando, será que Sanches está doente, deprimido, o que se passa na cabeça dele para manter essa barba feia?

Eu digo, não estou doente, nem deprimido, estou apenas curtindo um momento especial da minha vida. Interessante. Na primeira crônica que falei sobre a experiência de deixar a barba crescer, um plagiador do meu trabalho, inocentemente manteve a minha história ao pé da letra, ao ponto de descrever a minha barba como se fosse dele, esse é o problema do imitador, quando li aquela passagem no escrito do larápio das minhas letras, fiquei desorganizado, irado, zangado; pensei até em deixar de escrever nas redes sociais, depois voltei atrás, afinal a barba é minha, quem a descreve como sua, não passa de um pandilheiro de ideias, que não deve ser considerado.  

A minha mulher foi muito clara ao dizer sobre a minha barba “Eu particularmente não gosto” e o pior, tem gente que nem conheço, que não convive comigo e está incomodado com a minha linda barba grisalha. Ao ponto de enviar uma mensagem pelo WhatsApp que dizia o seguinte: “deixa eu te falar, alguns seguidores teu, estão falando da tua barba, perguntando se está precisando de um barbeador? ”. Para encerrar a conversa tenho mais de dez barbeadores sobrando em casa, só não quero tirar a barba e pronto! Que gente preocupada com a beleza dos outros, ou melhor com a minha.

Disse para a minha querida esposa responder aos curiosos que estou me reinventando e junto enviei uma citação de autor desconhecido que dizia: “Todo homem com barba descobre uma fonte de juventude quando faz a barba e fica 15 anos mais novo”. E continuei: “Barba, alguns gostam, outros não a tem”. No entanto, não cansam de provocar quem as tem. Não é à toa que a inveja é um dos sete pecados capitais, tem pecador para todos os gostos e barbas.

“O pecado original está em nós como a barba. Barbeamo-nos hoje, parecemos apresentáveis e nosso rosto está limpo; amanhã nossa barba cresce de novo, e não para de crescer enquanto permanecemos na terra. De maneira semelhante, o pecado original não pode ser extirpado de nós; ele brotará em nós enquanto vivermos. ” (Martinho Lutero)

Vou encerrando por aqui! Tudo que escrevi foi para dizer que cansei da barba, porque começou a ficar desordenada, uns fios crescem mais que outros, alguns ficam espetados no rosto, não tem pente que os penteie, os cabelos do bigode começam a penetrar na boca passando a ideia de que estou sempre querendo comê-los, e, pelo que sei cabelo não é alimento, nem enche barriga, também, começo a perceber que o excesso de cabelos no rosto contrasta com o que falta na cabeça. Não é fácil explicar essa lógica, ilógica.

Outro ponto determinante para tirar a barba, está ligado ao fato, de que nesse período de pandemia do coronavírus eu preciso usar máscara diariamente, e, sabemos que a barba é incompatível com a máscara, porque não permite a vedação completa, aumentando a probabilidade de contrair o vírus. Não vale a pena manter a barba correndo esse risco, afinal, de que adianta ser barbudo e belo, com a vida fragilizada?

Vou sentir falta da barba porque já estava acostumando com a ideia, mas valeu a pena, se não a tivesse deixado crescer, não poderia descrever em detalhes as nuances de um barbudo nesta crônica. Como disse Voltaire: “ Criatividade é como barba. Você só a terá, se deixá-la crescer”.

Quem define o limite do crescimento da minha barba sou eu. Então chegou a hora de dar um basta nessa brincadeira de barbudo. Em breve, eu mostrarei a ela que quem manda na minha aparência sou eu. Sem, portanto, esquecer de ser grato pela experiência que passei. Em tudo daí graças!

Percebi por todo esse tempo que as mulheres se incomodaram mais com a minha barba que os homens, porque em casa tenho seis, esposa, filhas e netas, ainda bem que elas não têm barbas, para não estarem preocupadas com mais essa obrigação diária de tirá-la ou na outra hipótese, seria mais um gasto nos salões de beleza. Tudo para manter a formosura.

“Numa vida média de 50 anos, 80 a 100 dias são empregados pelos homens só no ato de fazer a barba. Ignora-se o que as mulheres fazem com esse tempo. ” (Millôr Fernandes)

São Luís, 07 de junho de 2020.

José Carlos Castro Sanches

É químico, professor, escritor, cronista e poeta maranhense. Membro Efetivo da Academia Luminense de Letras, da Academia Maranhense de Trovas, da Academia Rosariense de Letras, da Associação Maranhense de Escritores Independentes, da União Brasileira de Escritores e do PEN Clube do Brasil.


Autor dos livros: Colheita Peregrina, Tenho Pressa, A Jangada Passou; No Fluir das Horas é tempo de ler e escrever, A Vida é um Sopro, Gotas de Esperança, Pérolas da Jujuba com o Vovô e quinze livros inéditos. Visite o site falasanches.com e a página “Fala, Sanches” (Facebook) e conheça o nosso trabalho.

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NOTA: Esta obra é original do autor José Carlos Castro Sanches, com crédito aos autores e fontes citadas, e está licenciada com a licença JCS07.06.2020. Você pode copiar, distribuir, exibir, executar, desde que seja dado crédito ao autor original. Você não pode fazer uso comercial desta obra. Você não pode criar obras derivadas. Esta medida fez-se necessária porque ocorreu plágio de algumas crônicas do autor, por outra pessoa que queria assumir a autoria da sua obra, sem a devida permissão – contrariando o direito à propriedade intelectual amparado pela lei nº 9.610/98 que confere ao autor Direitos patrimoniais e morais da sua obra.

Comments (2):

  1. Maria José Lima

    26 de janeiro de 2022 at 11:20

    Texto brilhante!!!!E muito bem,a barba é sua!!!!!

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    • sanches

      2 de fevereiro de 2022 at 23:35

      Obrigado querida Maria José Lima. Aprecio sua atenção e generosidade. Forte abraço, José Carlos Sanches

      Responder

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