Por José Carlos Castro Sanches
“Como não amar corujas!
Quando você olha para os olhos de uma coruja, é como se ela arrancasse de dentro de você todos os seus segredos mais obscuros e ti libertasse dos maiores medos, é como se estivesse ti ensinando a não temer a nada e a ninguém! ” (Karolyne Reis)
No intervalo de um treinamento eu recebi uma mensagem da minha esposa, associada a uma foto: “meu bem, veja o filhote de coruja que encontrei no quintal da nossa casa. ” Amo a natureza! A mensagem e principalmente a linda imagem do filhote de coruja me alegraram naquela manhã de 11 de março.
Ao observar atentamente a fotografia daquele animal de olhos esbugalhados com as asas abertas sobre um pano amarelo que parecia um lençol, em posição de voar, porém sem habilidade, debruçado sobre a cerca viva dos arbustos que rodeiam a minha casa, como se fosse o seu ninho confortável, naquele maravilhoso quintal que me encanta e fascina pela simplicidade da natureza que o constitui: grama, árvores, arbustos, galhos, folhas, flores, areia seca ou molhada, sol e lua, às vezes os cantos dos pássaros e, o meu sapo de estimação que ao final da tarde sempre aparece para nos cumprimentar. E eu que os observo com amor e gratidão pela oportunidade única e dom que Deus me deu de contemplar o mundo com um olhar de poeta.
“Não há segredos que o tempo não revele. ” (Jean Racine)
Fiquei a me perguntar: por que a coruja escolheu o quintal da minha casa para fazer o seu ninho e dar a luz ao seu filhote? Será que sou confiável, ao ponto daquela ave mãe, soberana da noite, que para muitos povos significa mistério, inteligência, sabedoria e conhecimento oferecesse o seu próprio filho à minha guarda?
Mesmo com a capacidade de enxergar através da escuridão, conseguindo ver o que os outros não veem, viu em minha casa um lugar seguro para a reprodução? Só Deus saberá responder!
O que deve ter “pensado” aquela indefesa corujinha, quando foi flagrada naquela agonia de não poder voar diante de humanos, nem sempre racionais e sensíveis. Será que o seu nascimento ocorreu durante o dia ou à noite? Na chuva ou ao sol? Nem posso imaginar.
“Quem confiou os seus segredos a outra pessoa, fez-se escravo dela. ” (Baltasar Gracián y Morales)
Deve ter rompido a casca do ovo à noite porque os gregos consideravam a noite o momento propício para o pensamento filosófico e, que pela sua característica de animal notívago era também vista pelos gregos como símbolo da busca pelo conhecimento. Pela “cara” da corujinha era inteligente ao ponto de saber escolher a hora certa para sair da casca (escuridão) e se apresentar para o mundo (luz), nem sempre acolhedor para os animais.
“Nossa existência não é mais que um curto circuito de luz entre duas eternidades de escuridão. ” (Vladimir Nabokov)
Imaginem se a coruja soubesse que havia uma tradição que dizia: “quem come carne de coruja adquire seus dons de previsão e clarividências, mostrando poderes divinatórios. ” Certamente, não escolheria um lugar próximo aos homens para procriação dos filhotes.
Apesar de sabemos que a coruja simboliza a reflexão, o conhecimento racional e intuitivo. E que na mitologia grega, Athena, a deusa da sabedoria, tinha a coruja como símbolo. Também, sabemos que os homens perderam a sensibilidade para a preservação da fauna e flora.
“Somos labirinto, somos fauna e somos flora! ” (Katiana Santiago)
Enquanto todos dormem a coruja fica acordada, com os olhos arregalados, vigilante e atenta aos barulhos da noite. Por isso, representa para muitas culturas uma poderosa e profunda conhecedora do oculto. Deve conhecer mais do fundo do meu quintal que eu.
Quem sabe ela tenha chegado à minha casa para revelar-me algum segredo para que eu possa ser um homem melhor, perceber os animais como uma benção divina e, em vez de maltratá-los ou exterminá-los, me ocupe em cuidar e protege-los para que os meus netos, bisnetos e as futuras gerações, também possam desfrutar da beleza ingênua de uma coruja, acuada, com asas, mas sem poder voar, no fundo do quintal.
“Como podemos nós pretender que os outros guardem os nossos segredos se nós próprios não os conseguirmos guardar? ” (François La Rochefoucauld)
Este animal tão especial que além de todas as características tem a particularidade de conseguir girar o pescoço em até 270º para observar algo ao seu redor, permanecendo com o resto do corpo sem o menor movimento. Além, da grande capacidade de visão e audição que torna as corujas exímias caçadoras. Quem sabe estava a me proteger enquanto eu dormia com a minha família.
As corujas são encontradas em todos os continentes, com exceção da Antártida. Atualmente são descritas cerca de 210 espécies de corujas, das quais 24 já foram registradas no Brasil. Mas, não podemos baixar a guarda porque os predadores humanos estão por todas as partes. Ontem mesmo vi, uma chinesa, enquanto cortava uma cerca viva, ao encontrar um ninho com três filhotes de pássaros, os comeu como se fosse um pedaço de pão, com a maior satisfação, sem demonstrar remorso. Fiquei atônito com a atitude daquela senhora pela conduta que parece normal naquele pais. Nesse ritmo em poucos anos não teremos mais ninhos, nem pássaros, e certamente passaremos por maiores dificuldades.
As corujas apresentam uma grande variação de tamanho, sendo que no Brasil temos desde os pequenos caburés (cerca de 60 g) até os jucurutus (Bubo virginianus) com cerca de 1 kg. Suas penas são lubrificadas por um óleo à prova-d’água que elas passam no corpo, tornando-as impermeáveis.
Roedores silvestres e insetos constituem as principais presas da maioria das corujas. Os olhos das corujas são grandes e voltados para frente. Veem muito bem tanto durante o dia quanto durante a noite, porém são incapazes de enxergar na ausência total de luz.
“A luz é especialmente apreciada após a escuridão. ” (Textos Judaicos)
A audição também é muito bem desenvolvida e muito utilizada na caça. Na maioria das vezes a presa é detectada pela coruja através dos ruídos produzidos durante a locomoção no solo ou na vegetação. Nesse momento, a plumagem macia e a ”dentadura” que possuem nas penas deixam o ar fluir livremente e, pela falta de impacto, reduz o ruído da batida das asas e permite a aproximação da presa através de um voo extremamente silencioso.
Possuem bicos curvos e garras muito fortes com unhas encurvadas e afiadas para capturar e matar as presas, que na maioria das vezes serão engolidas inteiras.
“Não seja ingênuo! Coruja quando olha para o Céu…
Não está em busca de oração e sim da presa! ” (Horlando Halergia)
No dia seguinte ao visitar o quintal, não mais encontrei a “corujinha”. Não sei o destino daquele animal aparentemente inofensivo, de olhar penetrante, que se apresentou por um dia em minha casa.
Talvez a sua única missão fosse me fazer refletir sobre a vida dos animais silvestres – para que diante da reflexão pudesse escrever esta crônica e compartilhar com os leitores, fazendo-os perceber que o nosso papel na terra, além, da sobrevivência é preservar a natureza bela que nos alimenta, inspira e permite viver os poucos dias nesta passagem pelo planeta terra.
Se me perguntarem onde está a “corujinha” que me ensinou a amar, ainda mais, todas as corujas e por extensão os humanos. Estará viva ou morta? Eu direi triste, não sei!
“Talvez a morte tenha mais segredos para nos revelar que a vida. ” (Gustave Flaubert)
São Luís. 13 de março de 2020.
José Carlos Castro Sanches
É químico, professor, escritor, cronista e poeta maranhense.
Membro Efetivo da Academia Luminense de Letras – ALPL
Autor dos livros: Colheita Peregrina, Tenho Pressa, A Jangada Passou; No Fluir das Horas é tempo de ler e escrever, A Vida é um Sopro, Gotas de Esperança e outros nove livros inéditos.
Visite o site: falasanches.com e a página Fala, Sanches (Facebook) e conheça o nosso trabalho como escritor, cronista e poeta.
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NOTA: Esta obra é original do autor José Carlos Castro Sanches e está licenciada com a licença JCS13.03.2020. Você pode copiar, distribuir, exibir, executar, desde que seja dado crédito ao autor original. Você não pode fazer uso comercial desta obra. Você não pode criar obras derivadas. Esta medida fez-se necessária porque ocorreu plágio de algumas crônicas do autor, por outra pessoa que queria assumir a autoria da sua obra, sem a devida permissão – contrariando o direito à propriedade intelectual amparado pela lei nº 9.610/98 que confere ao autor Direitos patrimoniais e morais da sua obra.