Por José Carlos Castro Sanches

Foram aproximadamente quatro horas de viagem de São Luís até o povoado de Tetéu no Município de Santo Amaro na região dos Lençóis Maranhenses – de dunas, areia, água, sol e boas energias para o corpo e mente. Na passagem visitei os meus pais que residem em Rosário e percebi que a minha mãe tinha o desejo de participar do encontro conosco, todavia acompanhar o meu pai naquele momento era parte da sua missão como mulher virtuosa, companheira e amiga de todas as horas. Seguimos viagem até “O Canto do Tetéu” e ela ficou.
Jonas e Josete, cunhado e irmã, decidiram receber os familiares na casa recém construída à margem direita da BR – 402. Seguimos com malas, cuias e suprimentos para a passagem do ano novo no referido lugarejo.
Os anfitriões esperavam a todos ansiosos. Logo na recepção fomos recebidos pelo alegre proprietário que deve conhecer a linguagem do Tetéu e aguardava feliz, no portão de entrada da casa de veraneio, construída com amor na areia das dunas, ladeada pela vegetação nativa, tendo ao fundo um córrego de águas límpidas e bons fluidos para aliviar o estresse e maus presságios. Assim, estávamos a nove quilômetros de Santo Amaro, nos preparando para receber o novo ano que se apresentava. Éramos todos, esperança; sentíamos o aconchego do lar e o carinho dos familiares e amigos que ali se juntavam com o propósito de interagirem naquele lugar simples de beleza natural e hospitalidade inigualável. Enfim, estávamos em casa amiga preparados para festejar o ano vindouro de 2022, no “Canto do Tetéu”.

Por lá descobri que Tetéu é um pássaro que apresenta plumagem preta, branca e cinza, com uma faixa escura que ocorre do pescoço ao peito. A íris e as pernas são avermelhadas. No encontro das asas, a ave possui um osso pontudo, denominado esporão, que é exibido aos rivais durante o voo. Alimenta-se de insetos, artrópodes e moluscos terrestres. Soube também que é conhecido como “Quero-quero, quem-quem, espanta-boiada, xexéu, Tero-Tero ou abibe-do-sul”, em outras regiões. O tetéu é muito comum no Brasil, sempre alerta, é o primeiro a dar alarme quando alguém se aproxima. É um bom vigia. Tetéu quando grita algo está anunciando um predador ou visita está se aproximando.

O som agradável da caixa se revezava com o automotivo, e música rolava, enquanto nos divertíamos ora tomando uma gelada, ora vinho; comendo churrasco, banhando no córrego ou passeando pelas dunas; outras vezes deitado escutando o canto do tetéu e outros pássaros que nos alegravam do amanhecer ao anoitecer. E a chuva nos fazia pensar que a noite seria mal dormida na varanda desprovida de grades, acompanhada pelo vento que entrava e nos trazia a frieza de um dia de chuva e os respingos que batiam na rede e molhavam sem enxaguar o nosso corpo – liberando os pensamentos distantes e a incerteza, mas tudo não passava de imaginação criativa do cronista – a noite veio, e, com ela os insetos que rodeavam a lâmpada dos cômodos e empestavam por alguns minutos o ambiente, depois como benção divina desapareciam e seguiam rumo ignorado nas dunas e matas ao derredor. Tudo não passava de provação, enquanto debatíamos os aprendizados e lições de vida obtidos durante a pandemia – que ora parece estar sendo controlada – todavia, outros vírus se apresentam e ainda nos incomodam nestes dias, com gripes e outros sintomas, inclusive entre os participantes daquele momento único. Nada, porém que tirasse a paz, a alegria, a vontade de curtir o passeio e a pureza de um lugar onde o canto dos pássaros, o amanhecer saudável e o encanto da natureza se juntam para comemorar a vida. Como dizem: para ser feliz é preciso muito pouco – a felicidade está nas pequenas coisas.


Éramos 22 (vinte e dois) reunidos para receber 2022 de braços abertos: Jonas, Josete, Israel, Marcela, José Carlos, Socorro, Fabielle, Daniel, Bruno, Carlos Alberto, Cláudia, Darly, Rita, Ana Paula, Sofia, Oswaldo, Herivelton, Áurea, Uhilton, Elisângela, William e Uhilma. O número 22 é um número mestre que representa o mundo material e concreto. Ele está relacionado a tudo que envolve a construção, o trabalho, o poder e também o otimismo.


Estávamos juntos naquela missão. Os carros ladeavam a casa, os poços artesianos supriam a necessidade de água para o banho e outros usos, a energia trazida do poste à frente da propriedade garantia a iluminação e conservação dos alimentos, bebidas e mantimentos. A falta de conexão com o celular e outras mídias nos fazia livres da falsa sensação da amizade virtual, bem como das preocupações com as más notícias que sempre são mais destacadas que as boas, além de não permitir bisbilhotar a vida alheia no Instagram, Facebook e outras mídias sociais. Talvez essa tenha sido a minha melhor surpresa e seria a maior dificuldade para os fofoqueiros de plantão. Que bom estarmos distantes deles, certamente não iriam escolher um lugar sem Internet para passar a virada do ano – graças a Deus.


Também, visitamos a vizinha cidade de Santo Amaro e o Dunas Bistrô, um lugar aconchegante de comida boa – peixe e camarão – regado a drinque e bebidas para os que gostam – certamente fizemos uma boa escolha.
Quanto à cidade de Santo Amaro, eu mantinha a imagem de uma cidade pacata de ruas sem pavimento da última visita que fiz há dez anos. Agora está diferente, frustrei a minha expectativa ao encontrá-la seguindo o ritmo do progresso sem o devido planejamento urbano. Mas, ainda há tempo de desenvolver e implantar um plano urbanístico sustentável para que a cidade cresça mantendo a originalidade e a beleza natural, sem se deixar desfigurar pelas construções e pavimentos da contemporaneidade. Essa é apenas a visão de um leigo, sem desmerecer os avanços que o “desenvolvimento” possa ter trazido para os turistas e moradores da localidade.

A viagem para o Tetéu reforçou a minha convicção de que devemos nos dispor a fazer coisas diferentes, embora nem sempre seja fácil e agradável sair da rotina; precisamos conhecer novos lugares, viajar e contemplar a natureza; quebrar paradigmas e enfrentar as adversidades, sem perder a essência da vida. Criar uma atmosfera de congraçamento, de integração e convívio harmônico entre familiares e amigos. Aprender a servir e ajudar ao próximo, sem esperar nada em troca. Conhecer pessoas diferentes, dormir em rede na varanda aberta, sem grades; apreciar as flores amarelas do outro lado da cerca, atirar com espingarda de espoleta e vibrar ao acertar o alvo; ouvir os pingos d’agua da biqueira do telhado caindo na madrugada, apreciar o canto dos pássaros, jogar conversa fora, dama, dominó e xadrez; tomar um chope gelado, dançar, pular, gritar, se alegrar ou simplesmente deitar e dormir; tomar banho no córrego, passear nas dunas, observar a natureza e as pessoas, refletir, aprender, ensinar, ler e escrever. Quem sabe tudo isso seja o ensaio para um ano novo diferente.



Basta agora desvendar alguns mistérios: da balsa flutuante construída artesanalmente e do caiaque vermelho que viajaram sozinhos durante a noite conduzidos pelas águas do córrego, devido à chuva intensa que elevou seu nível, deixando o proprietário preocupado do amanhecer até reencontrá-los; da busca frustrada de ouro em terras de metais ferrosos; da sunga do banhista desconhecido, encontrada no quintal; da casinha da bomba de vovó Rita Zélia; dos insetos que apareceram subitamente e se apropriaram das luminárias acesas, até que fossem apagadas. Também é preciso decidir se é croa, ilha ou praia da Marcela; descobrir quais pássaros cantavam tão alto ao alvorecer – parece que queriam ser ouvidos por todo o mundo – e acordar a todos que dormiam e, além da misteriosa conexão com a Estátua da Liberdade de cima da casinha ao fundo do quintal, de onde se tentava fugir do real para o virtual. Precisamos reaprender a viver a realidade em detrimento da utopia que nos cerca – sem cerca, por ondas eletromagnéticas. Da coincidência dos 22 participantes para o Réveillon de 2022 no Tetéu e da minha primeira viagem, após a chegada do ano novo, do Canto do Tetéu a Santo Amaro, que contabilizou exatos 22 Km, no trajeto de ida e volta.


Durante as conversas surgiu a ideia do “Bloco do Tetéu”, as composições e músicas começaram a circular entre os participantes, quem sabe em breve estaremos novamente juntos para festejarmos o Carnaval no “Canto do Tetéu” ou melhor no “Canto da Folia”. Onde “A Vida é Só Alegria! ”. Como diz: Jonas. Por lá deixei a minha composição intitulada “É só Alegria!”, juntamente com duas outras de Daniel, como sugestão para os especialistas transformarem em música. Não sei se dá samba.


Era hora de voltar para São Luís, seguimos pela BR-402, no caminho contrário da ida, cruzamos as terras dos municípios de Santo Amaro, Primeira Cruz, Humberto de Campos, Morros, Icatu, Axixá e Rosário; onde mais uma vez paramos na casa dos meus queridos pais e encontramos Jozy , José Wilson e Caio Victor Sanches Sampaio que os visitavam. Antes, porém, fizemos uma rápida parada para aliviar a bexiga, tomar café e relaxar o corpo na “Barraca do Mineiro” na BR-402, território de Morros – lá visualizei alguns pássaros engaiolados: sabiá, xexéu, guriatã, e um papagaio solto no poleiro – o que me fez lembrar da infância em Rosário. Quando não tínhamos o devido cuidado com as aves presas nas gaiolas e o meu pai percebia a nossa negligencia no trato, ficava furioso e libertava todas.



Depois continuamos eu, minha esposa Socorro Sanches e o meu filho Carlos Daniel, chegamos a Bacabeira e seguimos pela BR-135, com destino à Ilha do Amor. Percorremos aproximadamente 250 quilômetros no retorno, somados ida e volta foram quase 500 km percorridos.
Hoje estou aqui alegre e feliz agradecendo aos anfitriões Jonas e Josete pela acolhida, atenção e carinho; aos familiares e amigos por me permitirem momentos de epifania – naquele lugar até então desconhecido que passou a ter espaço no meu coração e motivo de inspiração pelo aconchego, luz, brilho, canto, encanto e magia. Feliz 2022! É tudo que desejo a todos os presentes e ausentes. Deus seja louvado!

São Luís, 02 de janeiro de 2022.
José Carlos Castro Sanches
É químico, professor, escritor, cronista e poeta maranhense.
Membro Efetivo da Academia Luminense de Letras, da Academia Maranhense de Trovas, da Associação Maranhense de Escritores Independentes, da União Brasileira de Escritores e do PEN Clube do Brasil.

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NOTA: Esta obra é original do autor José Carlos Castro Sanches e está licenciada com a licença JCS02.01.2022. Você pode copiar, distribuir, exibir, executar, desde que seja dado crédito ao autor original. Você não pode fazer uso comercial desta obra. Você não pode criar obras derivadas. Esta medida fez-se necessária porque ocorreu plágio de algumas crônicas do autor, por outra pessoa que queria assumir a autoria da sua obra, sem a devida permissão – contrariando o direito à propriedade intelectual, amparado pela Lei nº 9.610/98, que confere ao autor direitos patrimoniais e morais da sua obra.




















