Por José Carlos Castro Sanches

“O perfume é a linguagem da nossa essência. Ele comunica sentimentos, transmite vibrações e expressa, em aroma, o que as palavras, por si só, não são capazes de dizer. Uma flor sem perfume, não é uma flor, é apenas um caule repleto de pétalas de tristeza. O mesmo vale para vida. ” (Autor desconhecido)

Faltavam dois dias para o aniversário. A esposa perguntou ao consorte o que ele desejava receber de presente das filhas naquela data especial. Por algum tempo o marido buscou na memória algo que realmente precisasse, e nada encontrou. Ele julgava essencial aquilo que conseguia lembrar de imediato, do contrário seria supérfluo. Pôs-se a avaliar o contexto atual e logo percebeu que nada era mais importante que a vida, a família e os amigos que estavam privados do convívio em razão das restrições impostas pela pandemia, que se repetia pelo segundo ano consecutivo naquele 26 de março. Parece que o tempo conspirava e estava de marcação com Mr. Sancho, que nada podia fazer para mudar a realidade, senão orar e aguardar com paciência o momento certo para juntar-se aos seus nas festividades de celebração de mais um ano de vida. Que deve ser a data mais festejada por um vivente, seguida dos meses, dias, horas, minutos e segundos que se somam para compor o ano.

O quase sexagenário, continuava a pensar nas referências de presentes solicitadas. Imaginou que uma boa lembrança seria: uma peruca multicolorida, um nariz vermelho de plástico e uma roupa folgada de palhaço para animar os netos e reviver momentos especiais da infância nos circos de Lambretinha, Carequinha e Arrelia.  Quando seguia junto às demais crianças aquele homem alegre que andava acima das multidões com pernas de pau pelas ruas da sua cidade natal, gritava: “E o palhaço o que é? E nós respondíamos: É ladrão de mulher”. Quanta felicidade! Assim quero estar no meu dia, como uma criança encantada com o palhaço.

A neta e a esposa insistiam em querer saber o que Mr. Sancho queria ganhar no seu aniversário. Ele voltou a pensar e aventou outra alternativa, visto que não tinha em mente nada surpreendente: que tal pedir às filhas três cestas básicas reforçadas para doarem a uma tia necessitada; uma amiga da família que teve a casa destruída pela chuva nestes primeiros dias de março e a uma conhecida que perdeu a perna devido ao diabetes? Por fim sugeriu: diga a elas que escolham qualquer presente. Estavam lançadas as possibilidades para a escolha do mimo.

Como de verdade não sabia o que queria ganhar, tampouco tinha uma opinião formada sobre o assunto, perguntei para a minha esposa o que ela achava que eu precisava. Ela respondeu imediatamente: um perfume!

Não sei bem o que ela quis dizer com isso, se estou a andar fedorento ou se o que ela justificou como motivo: “faz tempo que você não usa um perfume” – logo a neta Julie reforçou: é verdade vovô – o Sr. Precisa de um perfume! Eu retruquei: Por que? Ela ficou calada atenta à aula remota pela internet.

“O melhor perfume para você não é aquele que pega em um frasco, mas o que carrega em sua própria essência. “ (Jader Amadi)

Para melhor entendimento explicarei o motivo que não me atrai usar perfumes, além dos sabonetes, shampoos e cremes convencionais nos banhos, pós-barba e ocasiões especiais. É que apesar de ser trabalhador assalariado, com senso apurado para a higiene pessoal, tenho alergia a quase todos os perfumes baratos, poeiras, fungos, ácaros (parece coisa de metido a besta, mas não é – quem convive comigo sabe bem o que digo), como não tenho dinheiro suficiente para comprar perfume francês, prefiro a essência natural. 

Apesar do “ ato de perfumar-se ser um dos mais duradouros costumes do ser humano. Seja para disfarçar os odores naturais do corpo, seja como complemento de elegância e sensualidade, ou ainda para ter e transmitir a sensação de higiene, as pessoas consomem cheirosas essências, loções, desodorantes, talcos, colônias. Em tempos remotos, o uso de perfumes esteve inicialmente associado a ritos religiosos. Há mais ou menos 500 mil anos, quando o homem descobriu o fogo, tratou logo de prestar homenagem aos deuses oferecendo-lhes a fumaça que emanava das resinas e madeiras que queimavam.  

No século X, os alquimistas descobriram o alambique-engrenagem através da qual os líquidos se transformam em gasosos e novamente em líquidos, num processo chamado destilação.  Graças a isso e contando com a propriedade solvente do álcool, os árabes puderam pela primeira vez destilar água de rosas ”.

Quero crer que a minha amada esposa acertou na indicação do presente para um químico sensível à pureza da fragrância. Quem sabe ela queira me cheirar… cheiroso… neste dia do meu aniversário de 59 anos. O perfume deve fazer renascer os amores, a libido e sobretudo a esperança de chegarmos mais longe nessa maratona da vida que a cada dia vencemos uma batalha, o cheiro pode estimular as forças para continuarmos lutando por dias melhores ao lado das pessoas que amamos. O que me fez refletir sobre as coisas que deveríamos poder guardar: olhares, amanheceres, risadas, sensações, o som das ondas, o canto dos pássaros, o sibilar das cigarras e o cheiro de quem amamos. Essa é a verdadeira essência do perfume! São nos menores frascos que se guardam os melhores perfumes! Você concorda minha linda dos olhos de mel?  Assim, eu acredito!

“É da essência da flor que se faz o perfume. É da essência do amor que se faz a felicidade. ” (André Saut)

Eu encerrava esta crônica quando a minha neta Julie chegou segurando nas mãos uma pequena garrafa de vidro incolor transparente, cheia d’agua com pétalas de flores, brancas, roxas e vermelhas imersas, com um pequeno laço de barbante, entregou-me com um enorme sorriso no rosto e uma felicidade sem fim e abraçou-me dizendo: este é o seu presente de aniversário antecipado. O perfume mais cheiroso, meu perfume preferido, o que tem a essência do amor!

Agora eu entendi, aprendi, captei, senti, ouvi, cheirei e visualizei a essência do perfume. Ela reflete o aroma das rosas e das flores, por isso me alegro por mais uma primavera! Estou sorrindo comigo mesmo agradecido pela bênção da vida. Deus seja louvado!

“Em cada perfume, há uma história para ser contada e memorias para serem eternizadas. Fragrâncias nos transportam para outros tempos e outros espaços. Exale e espalhe o seu aroma pelo mundo! ” (Autor desconhecido)

São Luis, 24 de março de 2021.

José Carlos Castro Sanches

É químico, professor, escritor, cronista e poeta maranhense. Membro Efetivo da Academia Luminense de Letras – ALPL

Autor dos livros: Colheita Peregrina, Tenho Pressa e A Jangada Passou (Tríade Sancheana); No Fluir das Horas é tempo de ler e escrever, Gotas de Esperança e A Vida é um Sopro! (Trilogia da Vida), e outros dez livros inéditos. Visite o site: falasanches.com e a página Fala, Sanches (Facebook) e conheça o nosso trabalho como escritor, cronista e poeta. Adquira os Livros da Tríade Sancheana e Trilogia da Vida na Livraria AMEI do São Luís Shopping ou através do acesso à loja online www.ameilivraria.com.

NOTA: Esta obra é original do autor José Carlos Castro Sanches e está licenciada com a licença JCS 24.03.2021. Você pode copiar, distribuir, exibir, executar, desde que seja dado crédito ao autor original. Você não pode fazer uso comercial desta obra. Você não pode criar obras derivadas. Esta medida fez-se necessária porque ocorreu plágio de algumas crônicas do autor, por outra pessoa que queria assumir a autoria da sua obra, sem a devida permissão – contrariando o direito à propriedade intelectual amparado pela lei nº 9.610/98 que confere ao autor Direitos patrimoniais e morais da sua obra.