Por José Carlos Castro Sanches
“Milho de pipoca que não passa pelo fogo continua a ser milho para sempre. ” Rubem Alves
Está chegando o carnaval, os foliões estão na rua famintos, e os vendedores ambulantes ansiosos para vender os diversos produtos. Fique atento para algumas situações que podem colocar a sua vida em risco. Dentre elas, os alimentos que você irá consumir.
Neste episódio farei o papel de Advogado do diabo em defesa do indefensável vendedor de milho verde contaminado.
No sentido figurado, advogado do diabo é apontado como um indivíduo que defende um cliente ou uma causa que, moralmente, não há defesa.
O vendedor ambulante de milho verde é um indivíduo que por necessidade ou prazer escolheu a ocupação para que, de forma digna, honesta e ética possa tirar o sustento seu e da família através da venda de um produto que “supostamente”, atenderá aos requisitos básicos de segurança alimentar.
“Um bom vendedor é aquele que compra o que oferece se dispõe de recursos para tal. A essência é ter alguma coisa de qualidade nas mãos. ” Eike Batista
O comprador de milho verde. É aquele indivíduo que tem fome, às vezes pouca grana no bolso. Tem origem humilde da roça ou cidade. Não é galinha mas gosta de comer milho.
Recentemente circulou pela internet e recebi através do WhatsApp um vídeo que causa indignação aos consumidores de alimentos de rua. Não sei a procedência e veracidade da informação. Mas resolvi discorrer sobre o assunto.
Um Sr. Vendedor de milho verde cozido com um carrinho ambulante foi flagrado usando água de esgoto recolhido da rua para abastecer a panela ao cozinha milho verde. E vendia os milhos cozidos para os fregueses inocentes no bairro Açude Velho em Campina Grande na Paraíba.
Poderíamos imaginar de onde viria a água usada para cozinhar o milho? Por que o vendedor escolheu exatamente aquele ponto para estacionar seu carro ambulante?
Como todos, somos potenciais consumidores de comida de rua, em algum momento por necessidade, prazer, gula etc., estaremos no mesmo barco ou beco sem saída diante de um vendedor e um produto que nos atraia.
“Um bom vendedor, além de apresentar produtos, serviços e ideias, vende sonhos e desejos para as expectativas de seu cliente. ” Fagner Gouveia
Aquele homem aparentemente inofensivo e trabalhador usava água contaminada que escorria pela rua. Recolhia o precioso líquido com uma garrafa PET cortada ao meio e colocava na panela para cozinhar o milho.
Tudo era realizado com a maior naturalidade. Não parava por aí. Tinha também um pano, que vez por outra, ensopava na água infectada e limpava o carro de venda, as panelas e as mãos.
Interessante que toda vez que o ardiloso vendedor se virava para recolher a água, olhava de um lado para outro, desconfiado, como se soubesse que alguém o observava fazendo “merda”, percebendo que algo estava errado. Ele não sabia que havia uma câmera escondida num celular, na mão de um observador sagaz – maldita câmera – que documentava tudo. E que em fração de segundos, a sua atitude reprovável seria reproduzida nas redes sociais. Assim foi feito.
“O vendedor de ilusões ronda nossas vontades nos oferecendo produtos piratas para contaminarem nossas almas. ” Eduardo Henrique Correa da Silva
Agora pergunto: Onde está a vigilância sanitária? Quem ensinou este cidadão a cozinhar milho com água de esgoto? Quem o orientou sobre os princípios básicos de segurança alimentar? Afinal, este trabalhador recebeu a educação básica obrigatória ao cidadão brasileiro? Ou é mais um brasileiro que foi privado de frequentar as escolas? A água que usa para o seu próprio sustento é tratada, potável? Onde ele mora tem tratamento de esgoto? ou Vive num ambiente em situação similar ao local onde vende milho?
Se ele não recebeu instrução adequada para produzir e vender alimentos saudáveis. O que podemos esperar deste alimento produzido na rua com água de origem desconhecida? De onde vem o milho? Como foram colhidos, onde foram armazenados e manipulados? E as panelas?
Como fica o inocente comprador de milho cozido que gosta de saborear as delícias da rua? E os hospitais? Estão preparados para receber os doentes, tratar as parasitoses e outras doenças causadas por microrganismos patogênicos que nadam de braçadas naquele recipiente congestionado de bactérias, vírus, protozoários, fungos, leveduras… sei lá o que mais!
Já que não podemos mudar a estrutura e treinar os vendedores ambulantes de alimentos sobre os procedimentos básicos de segurança para uma alimentação saudável, só nos resta fiscalizar de perto os fornecedores de alimentos e denunciar os abusos, que se multiplicam nas vendas de rua, restaurantes, feiras, mercados… em todos os recantos do país.
“Um vendedor que não ama o que faz, não conhece o seu produto; vende por osmose. ” Wagner Lima
Este fato mexeu comigo, me fez perder sono e indignado, escrever está longa crônica. A bem da verdade a indignação toma conta dos brasileiros em diversos aspectos do dia a dia, tornando-nos às vezes amargos e desesperançados.
Aqui em São Luís do Maranhão tem diversos vendedores de rua com suas panelas de milho a ferver nas praças, avenidas, ruas, mercados e becos. Quando passeio com a minha esposa e familiares, quase sempre que os encontro, não me contenho. E não faço isso, apenas aqui.
Lembrei-me que na última viagem a João Pessoa, Recife e Fortaleza. Eu parecia criança naqueles pontos de venda de milho cozido. Não sei se na encarnação passada fui galo, para justificar esse acentuado apetite por milho. Que coisa gostosa é milho verde cozido. Com água potável ou contaminada? Não sei dizer. É uma incógnita. Tudo é possível!. Milho assado nem se fala. É bom demais!
A partir de hoje vou conter o meu desejo e buscar “alimentos seguros”. Evitar alimentos de rua afinal de grão em grão a galinha enche o papo, de espiga em espiga alimentamos a verminose, de milharal em milharal alimentamos os brasileiros e mantemos o Brasil como 3o (terceiro) maior produtor mundial de milho.
” Segundo a Organização Mundial de Saúde, morrem a cada ano 1,8 milhões de pessoas como consequência de enfermidades diarreicas, que em sua maioria são causadas pela ingestão de água ou alimentos contaminados por microrganismos perigosos ou substâncias químicas tóxicas. Além disso, outros milhares de pessoas sofrem todos os anos consequências graves por conta da ingestão de alimentos com algum tipo de contaminação. Assim “alimento seguro” é todo aquele que não causa nenhum dano à saúde quando ingerido.
O governo e entidades mundiais de Saúde reconhecem a seriedade deste problema e veem trabalhando em diversas instâncias para mudar esse quadro. Entretanto, apesar dos esforços, as doenças transmitidas por alimentos seguem representando um importante problema de Saúde Pública, além de causar prejuízos à economia do país, por meio dos custos diretos e indiretos gerados, assim como repercussões negativas na exportação de alimentos.
Cabe a cada consumidor selecionar os locais onde se alimenta ou adquire os alimentos, a fim de garantir alimentação saudável, aspectos de sanidade e integridade dos alimentos. Se cada um fizer a sua parte poderemos ajudar os fornecedores de alimentos a promoverem modificações necessárias para se adequarem perante a legislação sanitária brasileira” Ana Lúcia, Jacqueline Mechi e Priscilla S. Melo.
Você quer ser mais um nesta estatística? Ou Advogado do vendedor de milho verde contaminado?
A panela já está fervendo… a água contaminada borbulha. O milho é temperado com sal e fome. Como dizem: ” a fome é o melhor tempero.” Chegou o carnaval, tudo é festa e alegria. Depois, chegará a quarta-feira de cinzas e o arrependimento baterá à porta e, poderá ser tarde. Mas, se tudo estiver bem, quem sabe passará a Semana Santa com a família comendo milho cozido, assado, canjica, pamonha etc. Viva o Alimento Saudável! Viva o Brasil – 3o maior produtor de milho do planeta terral!
“Somos como milho pipoca…
É de dentro para fora, é passando pelo fogo, é assim que a gente se transforma.” Helenice Cunha
José Carlos Castro Sanches
São Luís, 15 de fevereiro de 2020.